quarta-feira, 14 de abril de 2010

Resposta duas

Belém, 25 de setembro de 1943

Meu amado,

não sabes o quanto estou em êxtase por receber tua carta, minha cabeça circula em redemoinho como os formados no rio pela embarcação que me trouxe até aqui. Não imaginas a sorte que tive, pois quase não recebi tua carta, quando ela chegou a Manaus eu já havia partido no primeiro barco, já estava indo pelo rio a caminho de Belém. Não fosse um anjo, uma alma caridosa, minha amiga e confidente Letícia Barros de Albuquerque, que ficou em Manaus a cuidar das minhas coisas, talvez eu estivesse agora ainda completamente angustiada por não ter notícias tuas, sem saber se encontraria novamente teu beijo, teus braços, teu peito junto ao meu, ou se encontraria tua lápide onde eu poderia apenas chorar o resto de meus dias. Letícia é uma atriz de uma rica família do Mato Grosso, que também veio a Manaus tentar a vida no Teatro Municipal, algumas vezes ela tem sido minha companhia e comigo chorou quando quase morri ao receber tua primeira carta. Meu Augusto, estes dias navegando me deixaram ainda mais triste, eu via o mundo vagarosamente passar e lembrava de cada feliz momento que passei contigo, do teu protetor abraço, que me fazia dormir sossegada, do teu sorriso cativante e sincero, que me acalmava, de tuas mãos a passear pela minha pele e pelos meus cabelos nas quentes noites do Rio de Janeiro, causando-me arrepios que não consigo descrever. Um remorso intenso esmaga meu coração por tê-lo deixado sozinho. Tu dizes que não foi egoísmo, mas bem sabes que foi, que eu pensei apenas em mim e no sucesso que eu faria em uma cidade nova e longe dos olhares reprovadores do meu pai. Ah, meu amor, perdoa-me, perdoa minhas inquietudes, meus arroubos de diva. Prometo nunca mais deixar-te, prometo largar-me eternamente em teus braços, faço tudo para sentir mais uma vez e para sempre teu coração a pulsar colado ao meu rosto. Cheguei hoje a Belém e espero logo conseguir partir ao teu encontro. Os dias se arrastam, eu sei, mas aguarda-me por favor, juro-te que valerá a pena. Se quiseres enviar mais notícias, envia para o Hotel Real aqui de Belém, eles saberão para onde encaminhar tua carta. Em breve estarei novamente em teus braços.

Sua amada eterna, Clara.

(por Marcelo Lima)

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